Vislumbra-se, no horizonte brasileiro, uma luz
que, conquanto ainda tímida, a pouco e pouco vai-se inflamando e, por certo,
brilhará ofuscantemente dentro de menos de um mês, quando, a 15 de janeiro
próximo, mudanças, cremos significativas, verificar-se-ão no cenário político
de nosso país.
Acostumados que estamos a abraçar a pura
democracia, sempre trazida à tona mesmo nos períodos em que governos
repressivos nos tentaram subtraí-la, a emoção a dominar nossos sentimentos,
deixamo-nos ficar à espera do acontecimento ímpar que nos presenteará com um
presidente civil, diga-se, aliás, o primeiro nos últimos vinte anos.
Mudanças são esperadas, em todas as áreas e
acreditamos que o futuro presidente encarregar-se-á de procurar novos caminhos
por onde o Brasil possa trilhar sem maiores temores ou reticências.
Desnecessário é ressaltar que um quadro assustadoramente negro e incrivelmente
caótico descortinar-se-á ante o próximo governante que, dentro de suas
limitações, a princípio, pouco ou nada poderá fazer para, com decisiva
pincelada, tornar esse quadro mais atraente. Dependentes somos de toda uma
situação histórica que nos faz agir predeterminadamente, sempre a depender do
veredito dos credores de nossa dívida externa, eternamente a sofrer as
consequências dos erros do passado.
O Brasil, estrangulado por essa crise aviltante,
que inibe seu desenvolvimento econômico, sempre a carregar sua ingrata condição
de país subdesenvolvido, pouca ou nenhuma mudança verá a curto prazo, se
persistir a atual conjuntura mundial, muito pouco se conseguirá realizar no
sentido de remediar nossos males mais aflitivos.
O futuro presidente não se pode arrogar o direito
de transformar o Brasil em um país desenvolvido, porquanto, como frisamos,
herdeiros somos de toda uma bagagem de erros e tropeços e bem assim dependemos
dos credores de nossa dívida. Evidentemente que, para modificar toda essa
situação, longo período terá de ser decorrido e muitos projetos terão de ser
analisados e colocados em prática.
A despeito dessas perspectivas nada animadoras,
acreditamos no futuro deste país e, como o único bem realmente valioso que
nosso povo possui é a esperança – que, aliás, jamais ser-nos-á subtraída –
nutrimos a esperança de que conseguiremos, com muito esforço e sacrifício,
neste oceano de inflação, miséria e desencanto no qual somos náufragos, nos
agarrar ao tronco providencial e, afinal, atingirmos a terra firme.
(Esta
crônica foi publicada, na edição de 22 de dezembro de 1984, na sempre lembrada “A
Tribuna do Ribeira”, há quase trinta e seis anos. Em 15 de janeiro de 1985,
Tancredo Neves foi eleito presidente pelo voto indireto de um Colégio
Eleitoral. Tancredo morreu e o vice, José Sarney, assumiu. O leitor já sabe o
resto da história).
ROBERTO FORTES, escritor e poeta, é licenciado em Letras e autor do livro de contos “O Tucano de Ouro - Crônicas da Jureia” (2012), além de centenas de crônicas e artigos publicados na imprensa do Vale do Ribeira. E-mail: robertofortes@uol.com.br
(Direitos Reservados. O Autor autoriza a
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