A insólita colaboração entre Sílvio Santos e Lula
As fronteiras entre o real e o
fantástico são decididamente tênues. No âmbito político, por exemplo, sobretudo
no quadro atual brasileiro, verificam-se com frequências alianças impensáveis
ou colaborações entre antigos arqui-inimigos. Para o PT, e para o seu homem
símbolo, Lula, Sílvio Santos, Abílio Diniz ou José Sarney sempre constituíram
referências demoníacas.
Deixando de lado os prós e os contras que caracterizam
a trajetória dos referidos empresários ou do político maranhense, o que
surpreende é notar como a infantilidade e a irresponsabilidade tomaram conta,
nos últimos anos, da quase “indefinível” esquerda brasileira.
Assim, se por um lado nos
surpreendemos com as revelações de uma suposta colaboração, anos atrás, entre
Lula e Sílvio Santos para salvar o Banco Panamericano, por outro, nos
resignamos com as atitudes incoerentes, marcadamente “populistas” e
oportunistas de um partido que nasceu da aliança entre o sindicalismo combativo
dos metalúrgicos e alguns intelectuais que, abandonando ou desistindo da luta
armada, nunca renunciaram ao ideal de implantação de um regime socialista no
Brasil.
Ora, a esmagadora maioria deseja,
com exceção, talvez, de uma parte da elite retrógrada e de mentalidade ainda
escravista, uma sociedade menos injusta, em que o trabalhador, por mais humilde
e desvalorizado que seja o seu ofício, receba uma remuneração digna, cumprindo
o que está escrito na Constituição, mas nunca foi devidamente aplicado.
Como
obter tal almejada justiça social? Não há um único caminho, mas há os que devem
ser evitados.
Em poucas palavras, no ato de
governar, seja um vilarejo, seja um grande país, o que conta realmente não é a
ideologia ou a fidelidade canina aos princípios partidários, mas a maturidade
do governante e a sua honestidade e coerência, além do respeito pelos direitos
humanos mínimos, consagrados e universais, como o acesso à educação de
qualidade, pública, de preferência, e à assistência médica.
A operação de
salvamento do Panamericano (ou, mais grave, a conivência com a corruptibilidade
intrínseca, ao menos no contexto brasileiro, das atividades exercidas pela
Odebrecht ou pelas empresas de Eike Batista) demonstra cabalmente a enorme
distância entre o discurso, retórico e vazio, e a prática efetiva dos governos
Lula e Dilma.
O maior pecado cometido por Lula,
por Dilma e pelo PT não consiste apenas em não ter sabido conduzir
adequadamente a economia brasileira, pois incompetências semelhantes, ou até
mais graves, já foram demonstradas por governos anteriores.
O que não se pode
perdoar aos governos petistas é a traição aos próprios princípios que nortearam
inicialmente a fundação do partido, tudo em nome de uma ambição cega de poder
e, sobretudo, de perpetuação num poder que, pela própria natureza dos regimes
democráticos, é saudavelmente renovável ou até reciclável.
Sérgio Mauro é professor da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp de Araraquara.